Uma Introdução

Uma Introdução

Porque criar um blog sobre as coisas que eu presenciei e ouvi durante minha carreira como professora de Educação Básica?

Nunca achei que alguém se interessasse por coisas que para mim são comuns, o cotidiano de uma professorinha.

Mas um amigo (Joseph), pensa diferente. Ele achou que minhas histórias poderiam ser interessantes. E me incentivou a escrever um Blog.

Talvez ele tenha razão. Afinal, uma pessoa que está em sala de aula a mais ou menos 20 anos deve ter algumas histórias para contar. E posso dizer que minha vida de professora (e esse blog é só sobre isso) não foi nada calma. Monotonia nunca fez parte da minha vida profissional. Criança é um bichinho que inventa...

As histórias que vou contar aqui são variadas. Algumas aconteceram comigo, outras com amig@s e alun@s. Para preservar a identidade das pessoas que foram protagonistas das histórias, vou trocar não apenas os nomes, mas outras características (idade/sexo/lugar onde o fato ocorreu). Resumindo, vou contar as histórias, mas sem revelar dados que possam identificar as pessoas envolvidas. Conto o milagre, mas não digo o santo.

Convido vcs a lerem um pouco dessas minhas 'aventuras' como professora. Trabalhei (e trabalho) em escolas de bairros bem pobres, onde faltava quase tudo. Menos a boa vontade de colegas e diretores para fazer a coisa dar certo. Pelo menos na maioria das vezes.

Voltando as aulas presenciais com a COVID

 Quando a Secretaria da Educação avisou que as aulas voltariam no modelo presencial fiquei muito apreensiva. Não apenas por mim (embora eu já estivesse vacinada, com as 2 doses, isso não impediria que eu adoecesse de COVID), mas principalmente pelas crianças. Voltando para a escola, convivendo com outras crianças (que poderiam ser assintomáticas), e sabe-se o que mais poderia acontecer.

Outros medos estavam relacionados a angustias que eu poderia ter a partir do encontro com meus anjos: 

-Todas as crianças voltariam?

- As famílias de meus anjos sofreram perdas? Se sim, como não piorar a situação que por si só já é bem delicada?

Tantos receios...

Mas voltamos. Nem todas as crianças voltaram ao modelo presencial. Algumas ficaram apenas com o ensino remoto (que acontecia em um horário apenas ao dia, nem é bom pensar na desgraça).

 
Mas voltando às aulas presenciais: elas começaram com distanciamento. Passamos alguns meses com poucas crianças em sala. Já que nem todas voltariam presencialmente, fez-se um rodízio. Cada dia da semana um grupo (verde ou azul) tinha aula. Não era muito prático, mas funcionou. Eu tinha que ter muita organização (tudo anotadinho) para não me confundir e dar o assunto errado na no grupo daquele dia. Mas foi. 
Outra coisa que aconteceu, segundo a coordenação, para evitar aglomerações foi a retirada do recreio. Professores e professoras deveriam ficar em sala de aula todos os horários sem nenhum tipo de intervalo. Alguém viria pegar as crianças (turma por turma) levar para o refeitório onde elas pegariam a comida e voltariam para a sala, onde lanchariam. Professoras e professores que precisassem ir ao banheiro e beber água deveriam fazer isso bem rápido, deixando uma atividade na sala. Eu achava mais prático sair correndo da sala quando as crianças saíssem para pegar o lanche. Ir ao banheiro, comer alguma coisa (sou diabética, não posso ficar tanto tempo sem comer) e beber água. Uma correria só. Mas era o jeito. E como nesse momento estava com no máximo 16 alun@s em sala, foi menos complicado. Ah, e as crianças estavam temerosas, não aglomeravam. 

Isso foi uma das coisas que me chamou atenção (e a de outros professores e professoras) logo nos primeiros dias: as crianças estavam com medo. Usavam máscara, evitavam contato... Olhinhos meio assustados. Afinal, diferente das pessoas adultas, essas pessoinhas não tinham sido vacinadas. Estavam desprotegidas. 

Me peguei imaginando o que as crianças devem ter sofrido. Quantas pessoas próximas podem ter pego COVID e adoecido gravemente. Sabe-se lá o que essas crianças presenciaram. Mas estavam em sala. E nós tentamos o melhor. Acredito que a maioria das professoras e professores deve ter dado orientações sobre cuidados que deveria manter na escola.

Eu também tentei conversar. E durante essas 'conversas' descobri algumas coisas interessantes: as crianças queriam se vacinar (BOM!!) mas tinham medo da reação da vacina. Me contaram que algumas pessoas tiveram reação tão forte na primeira dose que estavam resistentes em tomar a segunda. Fui conversando, explicando que não se vacinar seria muito pior... É difícil. Comecei o semestre falando de vacinas. Da vacinação em si. Como tinha sido importante a descoberta da vacina, as doenças que estavam controladas/erradicadas por que as pessoas foram vacinadas. 

Foi um trabalho contínuo. Sempre que tinha a oportunidade falava sobre vacinação.

Quando alunas e alunos dos 9º anos começaram a se vacinar foi muito emocionante. As crianças contavam, se sentiam importantes. Amei!!

Mas as aulas presenciais mudaram. De repente eu tinha na sala os dois grupos. O distanciamento sumiu. 

Mas continuamos sem recreio. Isso ficou desafiador. Pq se a justificativa para as crianças não terem recreio era o distanciamento, não teria lógica manter esse formato quando as crianças já estavam aglomeradas em sala. O 'distanciamento' em sala era o espaço da carteira. Ou seja, a mesma coisa antes da Covid. Mas o recreio não voltou. As crianças, presas na sala de aula, aglomeradas. O que aconteceu? As criaturas deram um jeito de ter o intervalo, mesmo que ele não existisse. Elas saíam da sala para pegar o lanche e não voltavam. Ficavam no pátio, nos corredores, no banheiro. E nós, professores e professoras em sala, com um pingo de alunos e alunas. Ainda bem que o semestre terminou logo. Eu já nem sabia mais o que fazer para trazer as criaturas para a sala. Alguns momentos eu queria poder amarrar as criaturas na sala. 

Sinceramente, foi um período horrível. Só não foi pior pq consegui perceber as crianças aprendendo. Isso deixa a gente mais feliz. Porque por mais difícil que esse período tenha sido, saber que as criaturinhas aprenderam alguma coisa foi bem legal. Me fez bem. Acho que qualquer professor ou professora se alimenta do olhar da descoberta, da compreensão. Isso faz todo o estresse, a angústia e até nossos medos serem eclipsados pelo olhar dessas coisinhas. É indescritível, é lindo!